É frequente ouvir-se dizer que os anarquistas vivem no mundo da lua, no meio de sonhos futuristas, sem ter em conta as causas do presente. É talvez o fato de as vermos demais, sob as suas verdadeiras cores, enfim, como elas são, que nos leva a assentar o machado nessa floresta de preconceitos autoritários que nos assediam por todos os lados.

Longe de vivermos em um mundo fantástico e de imaginarmos os homens melhores do que realmente são, vemo-­los tais como são. E por assim os vermos é que afirmamos que o melhor dos homens torna­-se essencialmente mau pelo exercício da autoridade e que a teoria do “equilíbrio dos poderes” e da “inspeção das autoridades” é uma fórmula hipócrita inventada pelos detentores do poder para fazer crer ao “povo soberano”, que, no fundo, detestam, que ele é quem governa.

Precisamente porque conhecemos os homens é que declaramos aos que imaginam que sem esses protetores os homens se comeriam uns aos outros: racionais como aquele rei que, tendo perdido o trono e sido posto na fronteira, exclamava: “que vai ser dos meus pobres vassalos sem mim!”

Ah, sim, se os homens fossem esses seres superiores com que os utopistas autoritários nos martelam os ouvidos, se pudéssemos fechar os olhos à realidade e viver, como eles, em um mundo de ilusões acerca da decantada superioridade dos que julgam predestinados ao mando, talvez então fizéssemos como eles: acreditaríamos nas virtudes mirabolantes dos que nos governam.

Pietr Kropotkin

Observando as coisas como elas são
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