Temos, em geral, o costume de exagerar tanto nossa força quanto nossa debilidade; assim, durante épocas revolucionárias, nos parece que o menor de nossos atos deva ter consequências incalculáveis e, ao contrário, em certo marasmo, toda a nossa vida, ainda que consagrada inteiramente ao trabalho, nos parece infecunda e inútil.

Que devemos fazer então para mantermo-nos em estado de vigor intelectual, de atividade moral e de fé no bom combate?

Dirigi­-vos a mim, porque supondes que tenho experiência das pessoas e das coisas.

Pois bem, em minha qualidade de uma pessoa idosa, me dirijo às pessoas mais jovens para dizer­-lhes:

Fora as querelas e personalismos. 

Escutai os argumentos contrários depois de haver expostos os vossos; sabei calar e refletir; não procureis ter razão em detrimento da vossa sinceridade.

Estudai com discernimento e perseverança. O entusiasmo e a abnegação, ainda que até a morte, não são o único meio de servir a causa. É fácil dar a vida; nem sempre é fácil conduzirmo-­nos de modo que nossa vida sirva de exemplo.

A pessoa revolucionária consciente não é somente uma pessoa de sentimento, é também uma pessoa de raciocínio, cujos esforços totais em procura de maior justiça e solidariedade se apóiam sobre conhecimentos exatos e sintéticos de história, sociologia, biologia. É o que pode, por assim dizer, incorporar suas ideias pessoais ao conjunto genérico das ciências humanas e enfrentar a luta sustentada pela imensa força que esgotará em seus conhecimentos.

Evitai as classificações; acima de partidos e pátrias, de proclamar-­vos russa, polaca ou eslava, sede pessoas ávidas de conhecer a verdade, despojadas de todo pensamento de interesse, de toda ideia de especulação ante pessoas chinesas, africanas ou europeias; a pessoa patriota chega a detestar uma pessoa estrangeira, a perder o sentimento de justiça que alimenta seu mais puro entusiasmo.

Não vos atreleis ao patronato, a chefia ou apóstola cuja linguagem seja considerada palavra do Evangelho; foge dos ídolos e não busqueis mais que a verdade de quando diga a amiga mais querida ou da pessoa professora mais sábia. Se, escutando­-a conservais alguma dúvida, buscai em vossa consciência e recomece o exame para julgar em última instância.

Refute, pois, toda autoridade, para cingir­-vos ao respeito profundo de uma convicção sincera, vivei a própria vida, porém reconhecei a cada um inteira liberdade de viver a própria.

Se vós lançais a luta para vos sacrificardes em defesa das pessoas humilhadas e ofendidas, em boa hora, companheiras, afronte nobremente a morte. Se preferes o lento e paciente trabalho ansiando por melhor por vir, melhor ainda convertei­-vos no objeto de cada um dos instantes de vida generosa. Porém, se escolheis a pobreza entre as pessoas pobres, em completa solidariedade com as que sofrem, que vossa existência irradie a claridade benfeitora, no exemplo perfeito e no fecundo ensinamento.

Saúde, camaradas!

Retirado e adaptado do original no periódico anarquista Ação Direta (Rio de Janeiro) –– Outubro e Novembro de 1952, nº83, ano 6, p. 3.

Queridas pessoas camaradas:
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